Prémio APP de Carreira de Investigação 2016 - Conferência do Premiado
A replicação em Psicologia e a Karma police: Desconfiança e desconhecimento
Leonel Garcia-Marques
(Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa)
O desenvolvimento da ciência psicológica está intimamente ligado à utilização sistemática da estatística, tendo determinados testes estatísticos (ANOVA, t-teste, Qui-Quadrado) parte da bagagem de qualquer psicólogo. Daí que há de 50 anos que os psicólogos nos seus fóruns próprios têm vindo a discutir questões relativa à boa utilização da estatística em Psicologia (por exemplo, como controlar a inflação do alfa em comparações múltiplas, como lidar como heterocedasticidade nos testes paramétricos, etc.). Nos últimos anos, este tipo de debates tem-se simultaneamente intensificado e simplificado. De tal modo, que parece prevalecer uma visão sobre a correta aplicação da estatística que defende que: a) os principais problemas de interpretação estatística se resolvem com amostras maiores (mais potência de teste?), b) que pode(re)mos usar procedimentos estatísticos para deteção e como prova de fraude e c) existe uma maneira correta de usar/interpretar a estatística que nos pode garantir a validade de alguns resultados, invalidade de outros e prevenir a ocorrência de erros futuros.
Na presente comunicação argumentar-se-á exatamente o contrário, a saber: a) os principais problemas de interpretação estatística resolvem-se com melhores métodos estatísticos e debate fundamentado. Optar por menor controlo experimental em troca de mais sujeitos é uma opção infantil, b) nunca poderemos obter um procedimento estatístico que nos forneça a prova de fraude ou de ausência de fraude, porque nenhum procedimento estatístico pode usado para provar, visto que qualquer procedimento estatístico carece de validade dedutiva (ou como diria Popper ou Fischer, de justificação racional). Aliás, ciência não pode funcionar sem um pressuposto de confiança, pelo que a deteção e denúncia de fraudes só pode ser consideradas tarefas científica menores, e c) não existe uma maneira correta de usar/interpretar a estatística que nos possa garantir a validade de alguns resultados e invalidade de outros porque o conhecimento estatístico é conjetural, falível e eminentemente criticável. O fundamental não é evitar erros é garantir à máxima eficácia aos mecanismos de correção de erros inerentes ao empreendimento científico (ver novo experimentalismo, autores como Mayo).